A eterna discussão de relacionamento (DR) entre os três Poderes é saudável à democracia, mas já teve dias melhores. A pauta do voto impresso tomou a agenda política do país de forma obsessiva, com o presidente Jair Bolsonaro em busca de sua aprovação, o que significa descredibilizar o sistema eleitoral que o elege desde meados de 1990 – e ele nunca perdeu um pleito. Em tom crescente, Bolsonaro arrumou espaço na agenda para entrar em atrito com o presidente Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luis Roberto Barroso, o que colocou mais gente na parada.
Vale destacar que o relacionamento de Bolsonaro com o STF não é bom desde o início do seu mandato. O presidente participou de atos antidemocráticos que pediam o fechamento da Corte. A animosidade distende o tecido institucional. A nova reunião da harmonia dos Poderes não ocorrerá, pois o presidente do STF, Luiz Fux, cancelou sua presença como resposta aos ataques. O Legislativo está no meio, com a PEC do voto impresso indo ao plenário, apesar de rejeitada pela comissão especial em 5 de agosto. O intuito do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), é apaziguar Bolsonaro e não dar espaço para questionamentos futuros ao resultado. Esse é o resumo dos fatos. O que MONEY REPORT destaca a seguir é a uma espécie de fotonovela sem final definido:
Capítulo 1: “Impressão sua“
Os personagens são o presidente Bolsonaro e o presidente do TSE, Luis Roberto Barroso.
“Ele [Barroso] quer eleições que possam ser manipuladas ou no mínimo que possam gerar dúvidas no futuro”
“‘Se eu perder houve fraude’ é um discurso de quem não aceita a democracia”
“Barroso virou semideus? Acha que é intocável? Quem o seu Barroso pensa que é?”
“Há coisas erradas acontecendo no país e precisamos estar alertas. Há retardatários que querem voltar ao passado”
“Todos os Poderes têm limites. Eu tenho limites. Por que alguns do STF acham que são donos da verdade? Que ninguém pode reclamar? Barroso tem que ‘baixar a crista”
“Uma causa que precisa de ódio, mentira, desinformação, agressividade e grosseria não pode ser uma causa boa”
“O que está em jogo é o nosso futuro e a nossa vida. Não pode um homem querer decidir o futuro do Brasil na fraude. Está certo quem vai ser o presidente do Brasil no ano que vem, como está aí?”
“Uma das vertentes do autoritarismo contemporâneo é o discurso de que ‘se eu perder houve fraude’. A inaceitação é alguém diferente de mim possa ganhar as eleições”
“Um imbecil”
“Sobre as ofensas direcionadas a mim, tratei com mais indiferença possível. Escolhi ser um agente do processo civilizatório”
“Não queiram que um homem sozinho resolva o seu problema. É igual um casal, os dois têm que resolver juntos”
“É isso que ocorre quando líderes carismáticos se elegem, se apresentando ‘contra tudo isso que está aí’ e oferecem soluções simples e erradas para problemas complexos”
Capítulo 2: “Rasgando o verbo”
Em defesa de Barroso, o presidente do STF, Luis Fux, cancelou o novo encontro entre os Poderes da República em seu discurso de abertura dos trabalhos do Judiciário.
“Alertei o presidente nesta Corte sobre os limites do exercício do direito da liberdade de expressão. Assim como, o necessário e inegociável respeito entre os poderes para a harmonia institucional”
“E o que tem se noticiado são reiteradas ofensas e inverdades aos integrantes desta Corte pelo presidente”
“O ministro Fux tem razão em muita coisa aqui, o diálogo entre os poderes. Até em uma guerra, os comandantes de Exércitos adversários conversam, para saber se o outro quer um armistício”
“Diante dessas circunstâncias, o Supremo informa que está cancelada a reunião entre os Chefes de Poder”
“Da minha parte, está aberto o diálogo, não tem problema nenhum. Só nós dois. Chama também o Rodrigo Pacheco [do Senado] e o Arthur Lira [da Câmara], nós quatro, sem problema nenhum”
“Vamos nós quatro rasgar o verbo”
(…)
Capítulo 3: “Truque de mestre”
No Congresso há uma PEC em discussão (135/19) que foi derrubada (23 contrários e 11 favoráveis) em 5 de agosto de 2021 na comissão especial. No que tange ao regimento interno, há o que se discutir sobre a ida da matéria derrotada ao plenário. As comissões, de acordo com as leis que regem a Casa, servem para aferir a admissibilidade da matéria para a votação. Não há uma clareza se a decisão do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), é válida ou inválida. Um melindre de quem conhece as regras.
É privativo da Comissão específica para estudar a matéria redigir o
Seção V. Capítulo 14. Art. 197. Regimento interno da Câmara dos Deputados
vencido e elaborar a redação final, nos casos de proposta de emenda à Constituição, de
projeto de código ou sua reforma e, na hipótese do § 6º do art. 216, de projeto de Regimento
Interno
“O plenário será o juiz para essa questão [voto impresso] que já foi longe demais”
“Tem uma articulação de ministros do STF para não ter o voto auditável. Vai ter que ter, se não tiver, vai ter. Ou o STF terá que apresentar uma maneira de termos eleições limpas ou teremos problemas ano que vem”
“Sejamos inspirados pelos ensinamentos de Aristóteles, Locke e Montesquieu, quando pontificaram o sistema de freios e contrapesos que formam a separação entre os Poderes”
“É como dançar junto, quem sabe até separado, mas sem pisar no pé de ninguém. Assim é um baile bom, assim é a vida, assim deve ser a convivência civilizada, democrática, harmônica e independente”
Ministro do STF, Gilmar Mendes: “Vamos parar de conversa fiada”
Nos capítulos anteriores
- Barroso, o inimigo da vez
- Derrubado na comissão especial, voto impresso irá ao plenário
- Ex-presidentes do TSE defendem urna eletrônica
- Bolsonaro e Judiciário vivem atrito institucional por causa do voto impresso
- TSE pede ao STF permisão para investigar Bolsonaro por fake news
- Barroso cita custos e riscos de voto impresso para defender urna eletrônica
- Câmara deve votar contra voto impresso depois das declarações de Braga Netto
- Sob apelo de Moraes, onze partidos selam compromisso para barrar voto impresso
- Voto impresso é inconstitucional, decide STF
- Gilmar Mendes manda PGR investigar ameaças de Braga Netto às eleições
- Bolsonaro falou pelo menos 90 vezes em fraude eleitoral desde maio
- Haverá eleições. “Não somos uma república de banana”, declarou Mourão
- Nem Aécio acredita que ganhou de Dilma em 2014
Uma resposta
Obrigada Money Report por essa matéria.