O ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal, Silvinei Vasques, foi preso ontem pela manhã, acusado de ter tentado interferir no resultado das eleições de 2022, impedindo eleitores de Luiz Inácio Lula da Silva de comparecer às urnas. Dificilmente Vasques deixará de ver o sol nascer quadrado no curto prazo. A julgar pela vontade do ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes, o ex-dirigente da PRF terá o mesmo destino do ex-ministro Anderson Torres e do ex-ajudante de ordens da presidência, Mauro Cid: vão mofar na cadeia por um bom tempo.
Há um flagrante exagero nessas prisões preventivas. Mas, diga-se, esse estratagema não foi criado pelo ministro Moraes. Quem usou e abusou desse recurso foi o ex-juiz e atual senador Sergio Moro durante a Operação Lava-Jato. Na prática, a Lava-Jato estendia indefinidamente a prisão dos acusados para que estes, extenuados, colaborassem com as autoridades e produzissem delações premiadas. O empresário Marcelo Odebrecht foi um exemplo: ficou no xilindró dois anos e meio e pôde cumprir sua pena em casa depois de dar detalhes do esquema de corrupção de sua empresa em depoimento à Polícia Federal.
O ex-ministro Antonio Palocci enveredou pelo mesmo caminho. Mas produziu uma delação com tantos furos que o delegado Marcelo Feres Daher, encarregado de analisar o teor das acusações do ex-petista, escreveu o seguinte em seu relatório: “Observa-se que as afirmações feitas por Palocci parecem todas terem sido encontradas em pesquisas na internet, porquanto baseadas em dados públicos, sem acréscimo de elementos de corroboração, a não ser notícias de jornais”. O hoje ex-procurador, Carlos Fernando dos Santos Lima, encarregado de negociar a quebra de silêncio do ex-ministro, foi cirúrgico sobre o texto apresentado à PF: “Muito gelo, pouco uísque”.
Moraes vai na mesma toada de Moro, segurando ao máximo aqueles que acusa na prisão, talvez com o propósito de provocar nos encarcerados um efeito semelhante ao observado em Palocci, que fez malabarismos para se livrar do xadrez.
O jurista Walter Fanganiello Maierovitch aponta outro problema na prisão de Vasques. “A regra é a liberdade”, disse ele em sua coluna no UOL. “O que ele estava fazendo para que se justifique uma prisão provisória?”. Segundo Maierovitch, as razões apresentadas são questionáveis.
No despacho do ministro Moraes, está escrito o seguinte: “As condutas imputadas a SILVINEI VASQUES são gravíssimas e as provas apresentadas, bem como as novas diligências indicadas pela Polícia Federal como imprescindíveis para a completa apuração das condutas ilícitas investigadas, comprovam a necessidade da custódia preventiva para a conveniência da instrução criminal”. Como se pode perceber, o texto do juiz não deixa claro exatamente qual é a razão que motiva a prisão do ex-PRF, especialmente porque os fatos que geraram as acusações ocorreram em outubro do ano passado.
Além de Vasques e Cid, ainda temos 128 pessoas detidas em Brasília por conta dos atos de vandalismo cometidos em 8 de janeiro, de motivação claramente golpista. Entende-se que o que esses indivíduos fizeram em Brasília foi muito sério. Mas a lei não permite que acusados respondam processos em liberdade? O que esses baderneiros ainda poderiam fazer para atrapalhar as investigações sobre a baderna ocorrida no segundo domingo do ano?
Quando a Lava-Jato começou a manter acusados na cadeia por uma temporada longa, a sociedade aplaudiu. Mas muitos juristas e advogados ponderaram naquele momento que um precedente perigoso estava sendo aberto – e que poderíamos ver as consequências desses movimentos em alguns anos. Infelizmente, aí estão os efeitos dessa enxurrada de prisões preventivas. Antes feitas por um juiz de primeira instância e hoje decretadas por um ministro do Supremo.
Por enquanto, há um espírito de corpo no STF, blindando as decisões de Moraes. Até quando isso vai durar?