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Aula prática de autodestruição de carreira

Autoproclamado defensor da liberdade, o ex-pré-candidato ao governo de SP Arthur do Val estava mesmo era de olho em ucranianas “fáceis porque são pobres”. Foi “na empolgação”, disse

Há quem acredite que para uma carreira política naufragar seja necessário ser pego envolvido em roubos, falcatruas e mamatas com dinheiro público. Não é verdade. Desde ontem (4), boa parte da opinião pública brasileira está indignada com as mensagens de áudio machistas e desumanas enviadas da Ucrânia pelo deputado estadual Arthur do Val (Podemos-SP), o Mamãe Falei. Ele vinha em uma carreira que beirava o meteórico. De corneteiro de internet e jovem indignado do Movimento Brasil Livre (MBL) que queria acabar com a meia-entrada no cinema, virou pré-candidato de seu partido ao governo paulista, embalado pelos 478 mil votos que angariou em 2018. Em menos de 24 horas foi abandonado pelos aliados, repudiado pela assembleia onde atua, criticado, zoado, alvo de uma petição online de cassação de seu mandato e deve enfrentar um processo por quebra de decoro. Para evitar maiores danos, retirou nesta tarde sua pré-candidatura ao Palácio dos Bandeirantes.

Nessa enxurrada, levou de roldão o ativista do MBL, Renan Santos, que teria um roteiro internacional para se aproximar de mulheres europeias – brancas, altas, loiras, magras, de acordo com os padrões objetificantes de beleza. Quem não gostou foi a castanha aloirada oficial, Giulia Blagitz, namorada do deputado. Por rede social, ela educadamente agradeceu tudo o que viveram e pulou fora da relação.

Linguadas

Do Val enviou quatro áudios para amigos – incluindo quem o denunciou ou passou adiante o conteúdo. Neles, faz observações machistas sobre as mulheres ucranianas, afirmando que elas são “princesas” e “fáceis porque são pobres”. São afirmações chulas e covardes partindo de um deputado eleito que se comporta como se estivesse no mais rampeiro dos botecos assoviando para as moças que passam. Mesmo afirmando não ter sobrado tempo “para fazer nada”, já foi o suficiente. Para quem foi à Ucrânia invadida para prestar solidariedade e entregar mantimentos aos refugiados, ficar cobiçando sexualmente mulheres e garotas amedrontadas que deixaram seus lares no fim do inverno europeu em busca de segurança é de uma covardia só superada pela exploração e estupro – o que parece que não houve. E há lugar para escatologia. O deputado afirmou que as guardas de fronteira era tão lindas que ele usaria sua língua para limpar o orifício excretor digestivo de todas. Até a omissa ministra dos Direitos Humanos e da Família, Damares Alves, o repudiou. “Nojento e sujo”, disse sobre o ex-aliado de Bolsonaro.

A presença de Mamãe Falei e de Renan Santos na Ucrânia já era alvo de críticas antes. Santos postou uma foto de 2016 como se retratasse o conflito atual. Ao ser desmetido por uma jornalista do site Metrópoles, partiu para o ataque: “Não sabia que era de 2016 e, honestamente, isso não faz diferença. Corrija aí seu post, mentirosa”. Na quinta-feira (3), Mamãe disse que estava na Ucrânia preparando coquetéis molotov. Na imagem, ele está em um pátio cheio de garrafas vazias em engradados. Não há nada que indique que eles participariam da resistência civil ucraniana.

A roupa curta

Desmascarado pelo áudios, Mamãe teve que voltar às pressas em um voo da Lufthansa que pousou em São Paulo na manhã deste sábado (5). Diante das câmeras, manteve o personagem. Disse ter cometido um “erro em momento de empolgação”. Como assim? Baseado em seu argumento tosco, um homem poderia justificar uma agressão sexual por excitação? É a velha e horrívelmente esfarrapada desculpa machista que coloca a culpa na vítima que usava roupa curta.

Contudo, o episódio teve alguns aspectos positivos. Além da natureza sexista do deputado ter sido exposta, evitou-se o risco de um acidente diplomático. Um representante eleito democraticamente no Brasil ser capturado por russos ou separatistas do Donbass geraria uma crise desnecessária. Um civil estrangeiro com coquetéis molotov para incendiar blindados poderia ser facilmente enquadrado como combatente irregular, desprotegido dos termos da Convenção de Genebra, o que no ímpeto do campo de batalha costuma terminar em vala ou paredão. Melhor ficar no Brasil arcando com a autodestruição da imagem de jovem político probo e disposto a acabar com tudo de errado que está aí.

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