O pedido de demissão, já confirmado, do Ministro da Justiça, Sergio Moro, pode ser interpretado de duas formas.
A primeira: o presidente Jair Bolsonaro se deixa levar pela impulsividade e diz que vai demitir o diretor-geral da Polícia Federal, Mauricio Valeixo, cuja exoneração foi publicada no Diário Oficial desta sexta-feira (24). Moro, diante disso, pede para pensar num nome alternativo e o presidente já lhe apresenta algumas opções, entre as quais a do secretário de Segurança do Distrito Federal, Anderson Gustavo Torres. Diante disso, o ministro pede demissão e é assediado pela turma do “deixa-disso”.
Segunda hipótese: o presidente recebe o briefing com o recorde de mortes registradas pelo coronavírus, que bateriam a casa de 400 óbitos informados num só dia, a ser divulgado ao final da tarde. Imagina, então, uma manobra diversionista, daquelas que tirariam a atenção da população do crescimento no número de falecimentos causados pela pandemia. A solução lhe surge: pressionar Moro, seu ministro mais popular, e fazê-lo pedir demissão, para depois tentar um recuo e manter tudo como estava. A imprensa, assim, dá menos espaço à pandemia e se dedica a cobrir a crise política.
Qual das opções é a verdadeira?
Não vejo Bolsonaro como um grande estrategista. Seu perfil é o de alguém impulsivo e movido a conflitos. Mas estamos numa série espetacular de discórdias com ministros, deputados e governadores. Há uma fila de ex-aliados do governo que aumenta mês após mês, fruto de brigas com o mandatário. São tantos desentendimentos que é o caso de se cogitar a possibilidade de o presidente ser um criador de factoides com o único propósito de manipular a atenção da sociedade.
Caso essa seja a verdade por trás dos acontecimentos recentes, um aviso: trata-se de uma série de tiros no próprio pé. Tome-se o caso de Moro. Caso ele fique no governo, seu comprometimento será cada vez menor, machucado pelas cizânias às quais vem enfrentando desde que botou o pé na Esplanada dos Ministérios.
Como acontece em um desentendimento que evolui para a briga física, aquele que bate esquece logo o ocorrido. O que apanha, no entanto, vai guardar lembranças muito mais duradouras do momento. Dependendo da personalidade, o agredido pode esperar em silêncio o melhor momento para dar o troco. Se essa vítima é alguém com grande trânsito no Ministério Público e na Polícia Federal, o estrago pode ser grande. Ou seja, mexer com esse tipo de pessoa pode ser pior que brincar com fogo.