Pipocam aqui a ali sinais de que o presidente Jair Bolsonaro não deve repetir o general Hamilton Mourão como vice-presidente em sua chapa no ano de 2022. Bolsonaro teria dito a aliados que não teria até agora estabelecido uma relação de total confiança com Mourão e, por isso, estaria disposto a substituí-lo na eleição de daqui a dois anos. Nomes do Centrão começam a ser discutidos, além de indicações próximas ao Planalto, como as ministras Damares Alves e Tereza Cristina, além do deputado Marco Feliciano.
Uma das vozes sensatas do governo desde seu início, o general Mourão não é perfeito. Em várias ocasiões, elogiou o torturador Carlos Alberto Brilhante Ustra, um coronel que abusou da covardia, crueldade e brutalidade nos porões do DOI-CODI, a principal masmorra de suplícios e flagelos da ditadura. Mourão é general reformado e, como tal, e se sente na obrigação de defender o governo militar, muitas vezes tentando transformar fraquezas em virtudes.
De maneira geral, contudo, é possível elogiar o equilíbrio e a retidão do vice-presidente. Ele não se deixa levar pelas emoções nos momentos mais complicados e tem quase sempre uma abordagem racional sobre temas polêmicos.
É de se espantar que o presidente queira se livrar justamente de quem aceitou sem pestanejar o convite para compor a chapa eleitoral em 2018. Para refrescar a memória: Bolsonaro tinha como candidato de coração o então senador Magno Malta, que preferiu concorrer à reeleição. Curiosamente, o então postulante à presidência pelo PSL liderava todas as pesquisas, mas enfrentava dúvidas sobre sua capacidade de se viabilizar até o final do processo eleitoral. Assim, levou algumas negativas até fazer o convite a Mourão, que foi prontamente aceito.
Desde que botou os pés no Planalto, Bolsonaro começou a ter ciúmes do vice. Culto, poliglota e bom orador, Mourão encantou a imprensa desde o início do mandato. Quase ao mesmo tempo, os bolsonaristas mais radicais começaram a atacar o ocupante da vice-presidência pelas redes sociais. Mourão foi chamado, por exemplo, de “melancia”, pois seria verde (militar) por fora e vermelho (comunista) por dentro.
Além disso, Hamilton Mourão é conhecido por fazer parte da turma do “deixa-disso” e jogar água fria nas crises. Sempre que ouvido pelos jornalistas em momentos difíceis, usou a voz da coerência e minimizou os problemas para enterrar polêmicas.
Conforme crescia a admiração em torno de Mourão, o núcleo duro do Planalto, Bolsonaro incluso, ia ficando incomodado com a figura do general. E, com isso, surgiram até alguns ataques através da internet. O vice, porém, soube desviar de todas as balas endereçadas ao Palácio do Jaburu – e sempre se mostrou publicamente fiel ao presidente.
Em empresas privadas, é muito comum encontrar CEOs que se melindrem com a sombra feita por determinados subordinados. São executivos paranoicos que enxergam inimigos até embaixo da cama. Muitos destes adversários internos até existem. Mas é muito melhor utilizar o talento alheio para alavancar resultados e obter promoções do que temer a ascensão de subalternos.
No caso de Bolsonaro e Mourão, vê-se claramente um superior incomodado com o brilho do subordinado (que não pode ser demitido). Não seria o caso de se aproveitar ainda mais das capacidades de Mourão para melhorar o governo, em vez de jogá-lo para escanteio?
Militares que assessoram diretamente Bolsonaro já sugeriram que Mourão aproveite a janela de 2022 para se candidatar ao governo do Rio Grande do Sul. Deixar o general longe de Brasília, no entanto, pode ser um risco para Bolsonaro. Corre-se o risco de o brilho do hoje vice crescer ainda mais. Longe das amarras da vice-presidência, Mourão terá mais liberdade para dizer o que pensa – e esse processo pode ser complicado para o governo, especialmente depois de 2022.
Por que tirar Mourão da vice-presidência? Não faz muito sentido. Mas talvez a origem de toda essa confusão esteja naquele velho ditado, que diz assim: “Ciúme de homem é muito pior do que ciúme de mulher”.