Ex-comentarista de TV alçado à política por suas posturas xenófobas e em defesa de um estado poderoso e interventor, capaz de devolver a França ao seu antigo status de potência hegemônica, o fundador do partido de extrema direita Reconquête (Reconquista), Eric Zemmour, sentiu no bolso. Ele foi multado em € 10mil (quase R$ 63 mil) por um tribunal de Paris por discurso de ódio. Em um programa de TV, sem o menor constrangimento, classificou crianças migrantes que chegam ao país desacompanhadas como “ladrões”, “estupradores” e “assassinos”. Zemmour tem especial predileção por atacar muçulmanos africanos, sendo que grande parte deles vêm de antigas colônias francesas e têm no francês sua segunda língua.
O episódio ocorreu em setembro de 2020, no canal de televisão CNews, onde era comentarista. Respondendo a uma pergunta sobre um ataque com faca praticado por um jovem imigrante paquistanês radicalizado, disse: “Eles não têm nada para fazer aqui. Eles são ladrões, são assassinos, são estupradores, é tudo o que são”.
Processado, nesta tarde (17) saiu sua condenação. A terceira. A primeira ocorreu em 2011, por racismo, a segunda veio em 2018, por insultar muçulmanos, está em revisão. Em outras seis ocasiões, desde 2008, acabou absolvido. Há também duas condenações anuladas. Em redes sociais, Zemmour reclamou que sua liberdade de expressão é tolhida por um “bando de políticos, jornalistas e jihadistas” e que é preciso acabar com “ideologia dos tribunais” – mas só quando a lei discordar de seu ponto de vista. Seu advogado disse que também vai recorrer da nova decisão.
Desde o início de dezembro, Zemmour se apresenta como candidato à presidência francesa. Ele convida seus seguidores a “mudar o curso da história” e promete “a reconquista” da França. A condenação vem em boa hora, pois lhe dá exposição midiática para ampliar o alcance de um discurso que faz sentido para os franceses natos em dificuldade econômica e com poucas perspectivas. Seguindo um receituário que lembra o da direita radical americana, Zemmour abraçou a tese conspiratória da Grande Substituição (Grand Remplacement), propagando que os brancos cristãos estão sendo substituídos demograficamente por imigrantes que acabar destruindo os valores nacionais.
Pelas pesquisas, seu partido, ainda que pequeno, tem alguma chance de chegar ao segundo turno contra o atual presidente, Emmanuel Macron. Zemmour e o Reconquête estão em quarto lugar nas intenções de votos. Nada mau para uma agremição que não possui dois meses de existência. Esse desempenho o fez ganhar aliados entre a direita conservadora, assumindo um lugar que antes era de Marine Le Pen na hora de atacar imigrantes. Zemmour é mais ambicioso de grandiloquente, se assumindo seguidor de Napoleão e Charles De Gaulle.
O desafio para ele agora é se manter em evidência, já que pela legislação eleitoral precisa obter, até meados de março, o endosso de 500 políticos eleitos para ter o direito de concorrer ao cargo que hoje é de Macron.