“Excelência,
Num programa de televisão em São Paulo, perguntaram a este velho repórter se podia vislumbrar no presidente um futuro ditador. Respondi que não. Ainda não. Argumenta-se, para a criação de uma atmosfera de terror em volta de seu nome e de sua pessoa, o absoluto desprezo que tem a certas normas de governo. […]
O desejo deste articulista não é o de advertir o presidente dos perigos que a mística do Poder lhe poderá trazer mais tarde se não conseguir controlar-se para monitorar os fios que lhe saem das mãos de condutor do povo. Nem o de lembrar que ele, se um dia saísse da trilha democrática, poderia calar a muitos jornais e jornalistas, mas não conseguiria silenciar todos os jornais e todos os jornalistas. Que não há mais lugar no Brasil para os regimes de força. Não é preciso apontar esses riscos a um presidente levado ao poder pela vontade de seus eleitores, mas deve governar, também, de acordo com os milhões que votaram contra ele. Isto é democracia. [..]
O presidente sabe, perfeitamente, que […] nem mesmo o general de maior prestígio no Exército teria a sorte numa aventura militar. Qualquer presidente que tentasse a deformação do regime e o seu fortalecimento através da união dos poderes após uma política de culto da personalidade e de vedetismo político, esse líder transformado em ditador, não o seria por muito tempo”.
Esse texto não é de minha autoria. Ele foi escrito pelo jornalista David Nasser, em março de 1961, e endereçado ao então presidente Jânio Quadros. Deste trecho, que compõe uma pequena fração do artigo original, pode-se tirar duas conclusões. A primeira, obviamente, é que a história tem o hábito de se repetir. E a outra? Bem, que a democracia pode ser mais frágil do que julgam os analistas mais experientes da cena política.