Como todos sabem, o deputado federal André Janones livrou-se da acusação de ter feito “rachadinhas” com os funcionários de seu gabinete. O processo que correu no Conselho de Ética da Câmara teve relatoria do também deputado Guilherme Boulos, que livrou a cara do colega e aliado de governo. O candidato à prefeitura de São Paulo afirmou que não iria julgar o mérito da questão e reforçou que o episódio havia ocorrido antes da presente legislação. Foi o que bastou para que doze congressistas votassem pelo arquivamento do caso, contra cinco que queriam a continuidade das investigações.
Ocorre que há um áudio de 2019, revelado pelo site Metrópoles, no qual Janones admite receber dinheiro de seus assessores, embora o congressista ressalve que esses depósitos seriam contribuições espontâneas de sua equipe para ressarci-lo dos gastos feitos nas eleições de 2016. “Eu acho que elas entendem que meu patrimônio foi dilapidado. Eu perdi uma casa de R$ 380.000,00, um carro, uma poupança de R$ 200.000,00, uma previdência de R$ 70.000,00”, disse Janones na gravação. “Eu acho justo que essas pessoas também participem comigo da reconstrução disso”. Mas, além disso, dois ex-assessores do deputado afirmaram à Folha de S. Paulo terem participado do esquema no qual desviavam parte de seus vencimentos para o chefe.
Desde 2018, o Congresso discute uma situação parecida, só que com o senador Flávio Bolsonaro, da época em que era deputado estadual no Rio de Janeiro. Há acusações de desvio de R$ 6 milhões em “rachadinhas” administradas pelo assessor Fabricio Queiroz, em cuja conta foram feitos quase 400 depósitos vindos de assessores da equipe do hoje senador. O que Boulos disse sobre o caso? Em post de 2021, o deputado afirmou que “rachadinha é corrupção” e que essa seria mais uma das razões para botar Flávio Bolsonaro na cadeia.
Pelo jeito, a virulência dirigida ao senador Bolsonaro é ignorada quando a mesma acusação é feita a um colega de sua base. Para disfarçar o uso de dois pesos e de duas medidas, Boulos argumentou que Janones não era parlamentar quando foi gravado – e citou uma decisão do Supremo Tribunal Federal neste sentido, afirmando que o deputado não poderia ser acusado de quebra de decoro.
Ocorre que a gravação em si foi feita em 2019, quando Janones já tinha sido empossado. Ao longo do áudio, ele diz que vários colegas já tinham apresentado projeto, ao contrário dele. “Ontem tinha uma fila de cem deputados apresentando projeto de lei. Eu sequer sabia disso. Por que eu não sabia? Porque eu não contratei nenhum especialista em técnica legislativa”, exaltou-se. Ou seja, não há nenhuma possibilidade de que Janones não estivesse atuando em plenário.
Resta saber o quanto este episódio pode chamuscar a candidatura de Guilherme Boulos. Mas o efeito, se houver, deve ser mínimo. O propósito do eleitor de Boulos não é apenas eleger o deputado, mas também derrotar o atual prefeito Ricardo Nunes. Em função deste segundo objetivo, esse escorregão deverá ser minimizado pelo eleitorado de Esquerda – mas poderá ser fortemente explorado na campanha eleitoral e nos debates de televisão. Como Boulos reagirá às provocações de Nunes e de outros adversários?
Essa reação poderá dar o tom de boa parte da campanha para prefeito e interferir nos resultados do Primeiro Turno do pleito. Aguardemos.
Uma resposta
O que só vem reforçar minha hashtag #nemnem.
Boulos, Janones, Flavio Bolsonaro e “tchurmas/parças/amigos/familiares…”. Sinto o mais absoluto desapontamento e descrédito em relação aos políticos de hoje em dia. Uma IMENSA PARCELA está lá, em primeiro lugar, pra ter “imunidade parlamentar”. Sabemos todos o porquê, né?