O cargo de ministro da Educação já abrigou intelectuais e professores de alta estirpe e, hoje, a pasta concentra um dos maiores orçamentos da União: acima de R$ 100 bilhões, um dinheiro carimbado que não pode ser desviado para outras finalidades. Era de se esperar que, num Ministério que abriga estrelas como Paulo Guedes, Tereza Cristina e Tarcísio de Freitas, o titular desta pasta fosse escolhido com um cuidado ímpar.
Desde o início do governo, no entanto, houve displicência na escalação deste nome. Primeiro, tivemos o filósofo colombiano Ricardo Vélez, cuja gestão foi marcada pela inépcia e a capacidade de enxergar comunistas em tudo quanto é lugar do sistema educacional brasileiro. O presidente Jair Bolsonaro, ao perceber que Vélez não daria conta do recado, afirmou sobre o então ministro: “está bastante claro que não está dando certo”.
Vélez recebeu o bilhete azul e Abraham Weintraub (assim como seu antecessor, uma indicação do escritor Olavo de Carvalho) assumiu o posto. Como Vélez, combateu o esquerdismo no ensino federal. Tirar o viés ideológico da educação, em tese, não é uma ideia ruim. Mas fazer disso a principal bandeira do ensino nacional é como contar a mesma piada algumas vezes: cansa rápido demais e não leva a nada.
Nesta semana, na mesma linha do comentário feito sobre Vélez, Bolsonaro disse que o ministro não havia sido muito prudente em participar de manifestação no último domingo. “É um problema que estamos tentando solucionar”, disse Bolsonaro, dando a entender que estavam buscando uma saída honrosa ao seguidor de Olavo de Carvalho.
Em sua gestão, Weintraub notabilizou-se por sua atuação junto às redes sociais, não raro se comunicando com erros de português constrangedores e criando situações embaraçosas, no melhor estilo “vergonha alheia”. Um exemplo disso foi o vídeo que gravou, utilizando a música “Singin’ In The Rain” como trilha e rodopiando um guarda-chuva nas mãos. Quando a música abaixava, ouvia-se o ministro dizendo que estavam “chovendo” fake News em cima dele. Outra intervenção inesquecível na mídia digital foi quando ridicularizou o sotaque chinês em um post sem pé nem cabeça.
O perfil amalucado do ministro é uma afronta aos eleitores de esquerda e embaraço tamanho família aos cidadãos conservadores em política ou em costumes.
Como muitos colaboradores de Bolsonaro, Weintraub olha com nostalgia para os tempos do governo militar. Se o período é digno de admiração por parte do ministro, deveria pelo menos se mirar em um exemplo da época: o advogado e escritor Eduardo Portella, já falecido, titular da pasta da Educação entre 1979 e 1980.
Portella tinha uma qualidade rara: gostava de ouvir. Além disso, dedicava-se a entender os anseios da comunidade universitária para colher subsídios que transformou em projetos de lei para melhorar a qualidade do ensino superior.
Foi essa proximidade com os intelectuais universitários, por sinal, que o levou à demissão. Numa greve de professores da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, deixou claro a todos que entendia as razões do movimento e não o condenava. Foi o suficiente para que se iniciasse um processo de fritura, durante o qual começaram a pipocar várias notas e matérias sobre sua eventual saída. Questionado sobre esses rumores, Portella disse uma frase lembrada até hoje. “Eu não sou ministro, eu estou ministro”, disparou.
A sentença tinha um sentido ambíguo. Servia para alertar que ele sabia que seus dias estavam contados no cargo. Mas também mostrava o caráter transitório do poder, que nunca é conservado por um só indivíduo e sim passado de mão em mão. A lição de Portella talvez caísse bem em Weintraub, cuja gestão é marcada por brigas com professores e acusações aos alunos. Nunca houve um ministro da Educação com tanta vontade de atracar-se com o setor no qual atua. Mas, curiosamente, se for demitido não o será por conta de seu pífio desempenho como ocupante da Esplanada em Brasília – e sim porque meteu os pés pelas mãos ao xingar autoridades em reuniões no Planalto, postar mensagens de credibilidade duvidosa e ter desobedecido uma ordem direta do presidente, a de não participar de manifestações de cunho anti-democrático no último domingo.
Weintraub será mesmo demitido? Até às 7:30 de 17 de junho, data de fechamento desta coluna, ele continuava ocupando o 8º. Andar do Bloco L da Esplanada. Muitos até duvidam de sua saída do governo, pois as críticas que recebe quase têm um efeito de blindagem. Considerado um dos auxiliares ideológicos do presidente, o ministro tem apoio de peso – os três filhos do mandatário. Ontem por exemplo, eles se revezaram na tentativa de manter Weintraub no Ministério. É por isso que o ministro parece massa de pão: quanto mais batem, mais ele cresce.
Nesta semana, quando Bolsonaro voltou a se desentender com o Poder Judiciário, é bem capaz que Weintraub gaste mais uma de suas sete vidas e fique ainda mais um pouco no governo. Afinal, esse tipo de situação é comum em Brasília. Tome-se o exemplo do ministro do Turismo, Marcelo Álvaro, que foi denunciado em fevereiro de 2019 por suposto envolvimento no desvio de verbas eleitorais e é alvo da imprensa desde então. Por vontade expressa do presidente, está no cargo até hoje. E não há nenhum sinal de exoneração no horizonte.