Utilizar truques econômicos para ganhar eleições é uma prática existente há muito tempo. Para ser mais exato, desde os anos do pós-guerra. Após 1945, a economia americana, assim como ocorria em vários países, seguiu totalmente a cartilha keynesiana segundo a qual o Estado tinha de intervir na economia para gerar empregos e, com isso, manter o consumo em alta. Empossado naquele ano, com a morte de Franklin Delano Roosevelt, o presidente Harry Truman manteve os gastos públicos no alto. Seu sucessor, Ike Eisenhower, seguiu à risca essa estratégia, embora tivesse reservas em relação às teses de John Maynard Keynes, especialmente no tocante aos seus efeitos sobre a inflação.
Eisenhower acabou gastando mais em defesa nos oito anos de mandato do que Roosevelt em toda a Segunda Guerra Mundial. E combateu eventuais engasgos de crescimento com dinheiro público investido em ações sociais, como a construção de rodovias. Mas, no último ano de mandato, resolveu que não queria fechar sua administração com um grande déficit (entre 1958 e 1959, as contas americanas ficaram negativas em US$ 13 bilhões). Cortou gastos e chegou ao final de 1960 com um superávit de US$ 259 milhões. Além disso, o Federal Reserve elevou fortemente as taxas de juros, apertando a política monetária.
Essas ações refrearam ligeiramente o crescimento do PIB naquele ano e tiveram impacto sobre o consumo da classe média, que vinha de uma década esplendorosa – não à toa, chamada de “Golden Age” (Era Dourada) por vários historiadores. Ao perceber que essa desaceleração criou descontentamento em parte do eleitorado, o então senador John Kennedy, candidato democrata à sucessão de Eisenhower, repisou insistentemente uma frase durante a campanha: “Vamos botar o país em movimento novamente”. Venceu o oponente por uma margem mínima, embora tenhamos de admitir que Richard Nixon era um candidato ruim quando comparado com o ar presidencial que a figura de Kennedy exalava — algo que ficou bastante claro no debate televisivo entre os dois (imagem).
Após a derrota dos republicanos em 1960, formou-se um consenso no mundo político – entre fazer a coisa certa e tentar ganhar as eleições, a segunda opção sempre vence. Esta estratégia foi adotada pela situação em praticamente todos os pleitos desde então. Vimos, por exemplo, a base aliada de José Sarney garantir ao eleitorado em 1986 que o congelamento de preços do Plano Cruzado seria mantido – apesar de todas as evidências em contrário. Dilma Rousseff, em sua reeleição, assegurou que manteria seu modelo econômico. Mas, uma vez reempossada, indicou o economista ortodoxo Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda. Hoje, vemos o governo, que em 2019 dizia seguir a agenda liberal, pisar fundo no acelerador dos gastos públicos para buscar a reeleição.
No fundo, o modelo democrático que prevê a reeleição induz os políticos a pensar em ciclos de quatro ou de oito anos. Na melhor das hipóteses, deixam para fazer a coisa certa no segundo mandato. Mas o que se vê frequentemente é o engajamento em uma candidatura de continuísmo, o que sempre faz impulsionar os gastos públicos em um círculo vicioso constante.
O fim da reeleição pode evitar a continuidade desse moto perpétuo. Mas o ideal seria contarmos com políticos que tivessem seus olhos postados no futuro, além de uma sociedade que também compreendesse a necessidade eventual de remédios amargos para resolver problemas da economia. Em dezembro, citei uma frase de humanista e escritor do século 19, James Freeman Clarke, que merece um repeteco: “O político pensa na próxima eleição; o estadista, na próxima geração”. Neste 2022 em que escolheremos nossos representantes nas urnas, precisamos lembrar deste ensinamento – e pensar bem na hora de votar.