Há pessoas que são como os vinhos e vão melhorando com a idade. A experiência, nestes casos, retira a impetuosidade e a ansiedade de campo e as substitui pela sabedoria e ponderação. Nem todos, porém, seguem esse exemplo. Há muita gente que pode piorar com o passar do tempo, dando mostras inequívocas de rancor e impaciência. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a julgar pelo desempenho em seus primeiros 100 dias de governo, parece pertencer ao segundo grupo.
Lula foi eleito por várias razões. Mas uma delas foi o apelo criado pela formação de uma frente ampla de forças políticas, sugerindo que o novo governo refletiria essa aglutinação de apoios. O que se viu no início do ano, contudo, foi o contrário: o partido do presidente ocupou as posições mais importantes da administração e deixou as migalhas para as demais agremiações. Com isso, uma apoiadora que fez diferença na reta final, a senadora Simone Tebet, quase ficou sem um gabinete da Esplanada dos Ministérios.
É possível perceber que o Lula de hoje é bem diferente daquele presidente que foi eleito em 2002. O mandatário de 2023 não parece estar preocupado em aglutinar apoio político, criando consensos e aproximando inimigos de outrora. Seu maior objetivo parece ser a imposição dos valores do PT a todo o país.
Lula repete o mesmo erro cometido por Jair Bolsonaro, que aliás não foi o primeiro a cair nessa esparrela. O presidente, como seu antecessor, acha que seus votos (60 milhões em universo de 156 milhões de eleitores) representam uma carta branca dada por toda a população.
A realidade, no entanto, não funciona desta maneira. O governo petista foi eleito com votos do centro, que acreditou em um governo de frente ampla. Esses eleitores desencantados, no entanto, podem migrar rapidamente para a oposição – e muitos já fizeram esse percurso.
O ex-ministro da Comunicação de Dilma Rousseff, Thomas Traumann, escreveu recentemente que “Lula fala sempre para seu cercadinho vermelho”. Traumann, com quem trabalhei na redação da revista Época, conhece as entranhas petistas como ninguém e é um sujeito bastante ponderado. Se ele acha que Lula está se comunicando apenas para sua torcida, a chance de acerto é de 100%.
Neste quesito, aliás, o que está ruim pode ficar pior. Lula já anunciou que vai instituir uma live semanal para criar um canal direto de comunicação com a sociedade. Ou seja, vai copiar a estratégia que Bolsonaro adotou durante seu mandato. Portanto, Lula copia dois comportamentos do antecessor: falar apenas para seus apoiadores mais ferrenhos e usar a rede semanalmente para inflamar esses eleitores.
Por que Lula piorou com o tempo?
Há dois fatores importantes nessa transformação. O primeiro seria a prisão efetuada pela Operação Lava-Jato, que o privou da liberdade por 580 dias. O Lula que saiu da Superintendência da Polícia Federal, em Curitiba, no dia 8 de novembro de 2019, é muito diferente daquele que foi encarcerado em 7 de abril de 2018. Guarda um rancor significativo e não esconde isso.
Outro ponto que deve ser levado em consideração é a influência da primeira-dama, Janja, sobre as declarações de Lula. Antes das eleições, Janja se definia como uma “petista de carteirinha” e suas opiniões têm efeito direto sobre a personalidade repaginada de Lula, especialmente o discurso sobre inclusão social e feminismo, que antes não fazia parte do repertório lulista.
O Lula de 2023, mais radical, se mostra distante do empresariado e da chamada Faria Lima. Conseguirá se manter dessa forma durante quanto tempo? Até agora, todos os presidentes que tentaram uma relação conflituosa com os empresários não foram bem-sucedidos. Lula será o primeiro?
Além disso, a popularidade do presidente irá depender diretamente do desempenho da economia brasileira. Enquanto a atividade econômica estiver combalida pela inflação e pelos juros altos (conta que ele diariamente despeja no colo do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto), ele não vai obter índices altos de aprovação, como ocorreu em seus dois primeiros mandatos.
Como a economia ainda não domou o dragão inflacionário, é de se esperar que os juros continuem altos por mais um período e que, com isso, Lula mantenha por algum tempo o discurso antimercado. Os agentes financeiros e empresários, no entanto, estão cansados desse teatrinho – e já mandaram emissários conversar com o presidente para que ele desça logo do palanque e passe a governar de fato o Brasil.
Isso vai surtir efeito? Difícil palpitar. Ao contrário daquele Lula de vinte anos atrás, essa versão atual é para lá de imprevisível…
Respostas de 2
Querer comparar com Bolsonaro é o equívoco principal dessa matéria. São pautas muito diferentes que não guardam qualquer comparação.
Não acho que ele piorou. Continua o mesmo. Nunca fez uma reforma necessária, deixou a indústria definhar com uma legislação trabalhista arcaica e prejudicial à atividade empresarial e ao emprego , e com um sistema tributário insano que só deixava alguns funcionarem e existirem por meio de regimes especiais e isenções. E agora quer destruir o que foi feito de bom como reformas trabalhista e da previdência, a lei das estatais e, o que é mais cruel, destruir o Marco do Saneamento. Isto é perpetuar a miséria em troca do que? Votos?