Para o presidente, o principal problema é o desmatamento e, ignorando Ibama, disse “achar difícil” haver impactos no litoral do Amapá
Um dia depois de afirmar que é preciso uma política unificada para os países amazônicos, o presidente Lula voltou a defender a possibilidade de exploração de petróleo na foz do Rio Amazonas, na costa marítima do do Amapá – o que foi negado pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) por causa da existência de uma delicada área de corais que pode abrigar formas raras de vida.
Lula começa um sutil cabo de guerra ambiental ao defender essa inédita prospecção petrolífera. “Não queremos transformar a Amazônia em um santuário da humanidade”, acrescentou o presidente durante conversa com jornalistas em Hiroshima, no Japão, ontem (domingo, 21). Todavia, um parecer contra a perfuração já havia sido divulgado pelo Ibama e conta com o aval do presidente do órgão, Rodrigo Agostinho – nomeado pelo presidente. Mesmo na gestão Bolsonaro essa prospecção encontrou resistência.
O documento indica que o plano da Petrobras não apresenta garantias em possíveis acidentes com o derramamento de óleo. O Ibama também criticou a ausência de estimativas de impactos sobre três terras indígenas em Oiapoque, no extremo norte do litoral brasileiro, na divisa com a Guiana Francesa.
Por sua vez, nesta segunda-feira (22) Lula recuou meio passo ao afirmar que o governo não emitirá licença para a Petrobras se isso gerar problemas ambientais. Todavia, o presidente também disse “achar difícil” que haja esse impacto já que, segundo ele, o ponto de possível exploração fica a 530 quilômetros da foz do rio – ignorando os efeitos de derramamentos como o ocorrido no Golfo do México, em 2010. Lula não leu um relatório sobre o tema – se tivesse, afirmaria categoricamente.
É uma coreografia presidencial de morde e assopra. Em agosto, ocorrerá em Belém (PA) a Cúpula da Amazônia, evento que reunirá os chefes de Estado dos oito países que integram a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA). Anunciar uma jazida possivelmente de óleo leve (mais valioso) seria uma maneira de mostrar ao mundo preocupações com o meio ambiente sem ignorar as possibilidades econômicas, já que muito dinheiro envolvido.
O presidente cobrou que os países ricos cumpram os compromissos assumidos no âmbito internacional, como a doação de US$ 100 bilhões ao ano para que países em desenvolvimento preservem suas florestas. “Em todas as COPs [Conferências do Clima das Nações Unidas] as pessoas falam que vão doar US$ 100 bilhões. Nós estamos aguardando”, disse.
Para Lula, seria preciso uma política séria, que envolva também os povos indígenas, para evitar o desmatamento na região e, ao mesmo tempo, garanta a sobrevivência das 28 milhões de pessoas que lá vivem. “Eles têm direito de viver, de trabalhar, de comer, de ter acesso a bens materiais que todos nós queremos. E, por isso, precisam explorar não desmatando. Explorar a riqueza da biodiversidade para saber se podemos extrair a possibilidade de desenvolver uma indústria de fármacos, de cosméticos, por exemplo, para gerar empregos limpos”, disse.