Os defensores das manifestações bolsonaristas sempre utilizam o argumento de que esses acontecimentos são pacíficos e que os cidadãos brasileiros têm direito à liberdade de expressão. Hoje, em Brasília, porém, os manifestantes ultrapassaram todos os limites da placidez e invadiram o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal. As palavras de ordem, berradas a plenos pulmões, pediam insistentemente uma intervenção militar para retirar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva do poder.
Um protesto que tenha como bandeira a ruptura da democracia, em tese, pode ser interpretado como um ato amparado pela liberdade de expressão. O inciso VII, do artigo 5º, por exemplo, diz o seguinte: “ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei”.
Do ponto de vista constitucional, portanto, essas manifestações que atentam contra a democracia poderiam ser toleradas pelas autoridades.
Mas a lei 14.197, em seu artigo 359L, aponta crime na tentativa de abolição violenta do estado democrático. E o artigo 359N da mesma lei também prevê penas para quem for mandante ou participante de tentativas de golpe de estado.
Portanto, à medida em que os protestos se transformam em baderna, com invasões e danos à propriedade pública, a tolerância com esse tipo de atitude é insustentável. Os prédios da Praça dos Três Poderes não podem ser invadidos ou depredados.
A resposta das autoridades federais foi lenta, diante da seriedade das imagens que se via pela TV: um número de manifestantes muito superior ao de agentes de segurança. Mas já se sabia que essa manifestação há vários dias. Assim, é inacreditável que nenhum esquema de segurança tenha sido montado para coibir os excessos que tinham sido teleguiados pelas redes sociais.
As imagens divulgadas ao vivo ontem foram fortes. A maioria dos invasores não teve nem o cuidado de cobrir seus rostos.
Essa manifestação tem tudo a ver com a estratégia que esses radicais expuseram nas redes sociais: disseminar o caos para tentar acionar as Forças Armadas a intervir da democracia. Em mensagens publicadas nas redes, os extremistas diziam que as Forças Armadas só entrariam em campo para intervir se houvesse uma “desordem institucional”. Nas redes sociais, assim, há textos com linguagem dúbia que falam sobre uma suposta exigência dos militares para dar um golpe: o caos. Os internautas radicais insuflam a população para que os militares evoquem a GLO (Garantia da Lei e da Ordem, um mecanismo previsto na Constituição para que o Exército entre em ação quando as tropas de segurança pública não têm condições de controlar sozinhas um cenário de desordem generalizada) e passem a controlar o Planalto. Só que, de acordo com a Carta, esse mecanismo só pode ser acionado pelo presidente da República e não pelas Forças Armadas.
Ora, oficiais das Forças são formados durante anos para garantir a ordem e impedir um cenário caótico. Dificilmente eles fomentariam um cenário de desordem para derrubar um governo democraticamente eleito. Além disso, não deixa de ser curioso o que é pedido aos generais, brigadeiros e almirantes: tomar o poder para deixá-lo na mão de um capitão reformado, que não é exatamente uma unanimidade no Alto Comando das Forças Armadas.
É impressionante como o cenário político brasileiro copiou o que ocorreu nos Estados Unidos nos estertores finais do governo de Donald Trump. Primeiro, Trump disse que haveria fraude, sem nenhuma prova, e perdeu as eleições. Depois, um bando de malucos invadiu o Capitólio, em um flagrante desrespeito às instituições democráticas. Aqui no Brasil, os extremistas foram além, pois também forçaram sua entrada no Supremo Tribunal Federal e no Palácio do Planalto.
O nome dessa balbúrdia realizada em Brasília é forte, mas apropriado: terrorismo. E o lugar de terroristas é apenas um – a cadeia.
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