A adesão do ex-governador Geraldo Alckmin à chapa de Luiz Inácio Lula da Silva gerou reações distintas entre o eleitorado. Há, basicamente, quatro tipos de resposta. Uma foi o inconformismo dos eleitores conservadores de Alckmin, que não engoliram essa parceria e ainda lembram de todas as críticas feitas pelo ex-peessedebista ao ex-presidente. A outra é a euforia dos partidários pragmáticos de Lula, que enxergam em Alckmin uma espécie de personificação da Carta aos Brasileiros de 2002. Entre os petistas, ainda, há quem tenha desgostado da aliança, pois o ex-governador seria um símbolo vivo da rivalidade entre PT e PSDB, que ainda é forte (mesmo que o novo aliado não seja mais tucano). Por fim, temos os eleitores de Centro que viram o movimento com simpatia – Alckmin seria uma força moderadora dentro de um governo petista e isso poderia agradar os empresários. Correndo por fora, há os partidários do presidente Jair Bolsonaro, que inundaram as redes sociais com vídeos antigos do ex-governador detonando Lula, em uma clara estratégia para minar a credibilidade da dupla.
Em um jantar promovido por um grupo de advogados no restaurante Rubayat, em São Paulo, Lula e Alckmin (imagem) foram vistos juntos pela primeira vez desde que começou o zumzumzum sobre a associação. Os dois não confirmaram oficialmente a aliança, mas deram todos os sinais de que o namoro virou noivado – daqueles em que o casal mora junto na mesma casa, mas ainda não assinou a certidão de casamento.
Mas, qual seria o papel de Geraldo Alckmin nesse governo petista 2.0?
O primeiro ponto a ser discutido tem a ver com a economia. Em seus dois mandatos, Lula preservou a fórmula de Fernando Henrique Cardoso, mantendo o tripé econômico. Dilma Rousseff, ao contrário, desmantelou essa regra e provocou recessão e inflação. Alckmin, assim, poderia ser uma garantia de que esse eventual governo Lula manteria as premissas do Plano Real e seguraria a alta de preços.
Não se espere, contudo, nenhum arroubo liberal ou onda de privatizações. Alguém se esqueceu da última campanha presidencial, na qual Alckmin vestiu um colete com as principais estatais brasileiras e garantiu que essas companhias não seriam privatizadas? Com Lula ao seu lado, a sintonia em favor da máquina estatal será fortíssima.
Será interessante ver como o candidato Lula irá lidar com as perguntas sobre os atos de corrupção praticados pelo PT no passado. Digamos que os jornalistas comprem a versão do ex-presidente, de que ele é inocente nos processos do Petrolão. Mesmo assim, é indiscutível que membros do partido estiveram envolvidos em diversas atividades nas quais dinheiro graúdo foi subtraído do Estado acabou nos bolsos de corruptos. Mas Alckmin, neste quesito, enfrentou também acusações de que em seu governo houve desvio de verbas em obras públicas.
Os brasileiros já têm uma noção de como será a economia sob Lula e talvez não queiram uma reedição da Carta divulgada 19 anos atrás. O assunto que provavelmente ganharia maior Ibope, hoje, seria a corrupção – quem sabe uma mea culpa petista ou uma garantia por melhores esforços no sentido de coibir o assalto ao Erário. Mas, aparentemente, um documento público sobre o tema está fora de questão.
Qual será a atitude de um possível governo Lula-Alckmin em relação à imprensa? Como seria esse relacionamento? Lula vai mesmo tentar controlar a imprensa? E quais seriam as bases deste controle? Alckmin fará algum esforço no sentido de evitar que os meios de comunicação sofram algum tipo de intervenção? Este mistério só será explicado nas próximas entrevistas ou nos debates entre candidatos.
Na pauta de costumes, pode haver certo conflito entre os companheiros de chapa. Os petistas, de certa forma, são fiadores de um agenda progressista de comportamento. Já Alckmin vem do interior e seu nome é constantemente ligado à Opus Dei, movimento religioso de caráter conservador, ao qual ele sempre negou pertencer. Haverá confronto de conceitos? A ver.
Sob o comando de Lula, o aparelhamento do Estado, com grandes processos de contratação de funcionários públicos, deve ser retomado – e o custo da máquina estatal voltará a subir. Alckmin poderá trabalhar contra esse costume arraigado do PT? Talvez não.
O que acontecerá com as leis aprovadas durante o mandato de Jair Bolsonaro que tinham como objetivo tornar a vida do empresário mais simples? Lula vai tentar anulá-las? Caso isso ocorra, o ex-governador deverá se intrometer no processo e se colocar junto aos empresários de seu estado, pois os empreendedores paulistas enxergam em Alckmin uma figura com ponderação e equilíbrio para representá-los.
Embora uma eventual eleição de Lula e Alckmin deva criar forte reação contrária por parte dos bolsonaristas, espera-se um apaziguamento de ânimos dentro do cenário nacional. Tanto Lula como Alckmin devem imprimir um estilo mais cauteloso na cena política e dificilmente farão provocações a seus adversários. Esta característica já é discretamente comemorada por alguns empresários – mas ainda é cedo para afirmar se Lula será mesmo eleito ou se o seu governo será de agrado a quem controla as empresas.
Por enquanto, nada é oficial e tudo está no plano das ideias. Ou seja, ainda teremos mais alguns meses de especulação até que o anel da dupla esteja mesmo na mão esquerda.