Hay Gobierno? Soy a favor.
Esse poderia ser o mote do senador Ciro Nogueira. Desde que entrou na política, em 1994, sempre esteve ao lado do governo. Qualquer governo. Seu primeiro mandato foi o de deputado federal, pelo extinto PFL, que estava na base de apoio de Fernando Henrique Cardoso. Em 2002, quando Luiz Inácio Lula da Silva seria eleito pela primeira vez, trocou de partido e assinou a ficha do PP. A mudança foi providencial à vocação governista de Ciro – afinal, o PFL jogou-se naquele início de administração petista na oposição.
Aninhado no PP, ele seria eleito senador e se tornaria um dos nomes fortes de apoio à administração petista. Tanto é que, em 2017, deu uma declaração peremptória, em vídeo que circulou ontem nas redes sociais: “Ele [Jair Bolsonaro] tem um caráter fascista, preconceituoso. É muito fácil ir para a televisão falando que vai matar bandido. É um discurso muito fácil, mas isto não é para presidente da República. Presidente da República é a pessoa que vai gerar emprego e renda, vai cuidar da saúde, vai cuidar da infraestrutura, do saneamento… Eu conheço Bolsonaro e ele não tem a capacidade de fazer isso. Ele nunca geriu nada, nunca foi prefeito, governador, mostrou algum trabalho”, disse. Na mesma gravação, o senador ainda afirma que faria campanha para Lula (mas, como o líder petista foi preso e considerado inelegível em 2018, Ciro apoiou Fernando Haddad, o candidato do Partido dos Trabalhadores).
O eleitorado de Bolsonaro em 2018 era um tanto heterogêneo. Havia entusiastas do governo militar (incluindo aqueles que pediam intervenção das Forças Armadas no governo), empresários, liberais, apoiadores da Operação Lava-Jato e muitos cidadãos ideologicamente alinhados com o Centro. O principal ponto de convergência entre todos esses eleitores era o anti-petismo. A Lava-Jato mostrou que o PT estava envolvido dos pés à cabeça em um dos maiores esquemas de corrupção já desbaratado no Brasil e isso feriu de morte as pretensões de mais um mandato presidencial por parte dos lulistas.
Os quase 58 milhões de votos dados a Bolsonaro na última eleição representavam um protesto claro contra a corrupção associada aos petistas e ao toma-lá-dá-cá que virou a relação entre Executivo e Legislativo. Com o respaldo deste mar de votos, o general Augusto Heleno chegou a cantar em um evento do PSL “se gritar pega Centrão, não fica um meu irmão”, parodiando o samba de Bezerra da Silva.
O tempo passou e Bolsonaro conseguiu brigar com boa parte do Parlamento e com a Alta Corte. O jeito foi fazer um acordo com quem? Com o personagem da paródia de Heleno. Esse apoio, no entanto, não veio de graça – o governo teve de abrir a mão em escala industrial, oferecendo cargos e verbas. Até tentou fazer vista grossa ao orçamento aprovado para o fundo eleitoral, de quase de R$ 6 bilhões, com o aval de bolsonaristas convictos como Carla Zambelli e Bia Kicis, além dos filhos do presidente, Eduardo e Flávio.
Até agora, as demandas do Centrão foram geridas pelo general Luiz Eduardo Ramos, titular da Casa Civil, e Onyx Lorenzoni, da Secretaria Geral da Presidência da República. Até os contínuos do Palácio do Planalto, no entanto, dizem que eles serão substituídos respectivamente por Ciro Nogueira e Davi Alcolumbre.
Vamos deixar de lado por um instante a fama do Centrão e de seus líderes.
O governo precisava desesperadamente de articuladores políticos – neste quesito, tanto Ramos como Onyx são duas nulidades e têm como grande credencial a amizade que os une a Bolsonaro. Ciro e Alcolumbre, assim, surgem para oferecer um diálogo consistente até com a oposição. E, pelo jeito, um cofre recheado de verbas para quem tiver boa vontade com o Planalto.
Trocando em miúdos: Bolsonaro assumiu com a promessa de ser diferente e acabou se tornando um presidente igual a José Sarney, Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva e Michel Temer (Fernando Collor e Dilma Rousseff não estão nesta lista porque não fizeram acordos com o Centrão e, também por isso, sofreram impeachment).
Pergunta-se: como seria o governo de Jair Bolsonaro, em termos de reformas e medidas modernizadoras, se tivesse feito esse acordo desde janeiro de 2019? Provavelmente, muito melhor do que o que vimos até agora (e bem mais loteado também).
Como diria Adriane Galisteu, o Brasil deu uma volta de 360 graus. Votou pela mudança, girou e caiu no mesmo lugar. Com o ônus de termos passado dois anos e meio em um clima beligerante e contraproducente, com direito a uma pandemia seríssima e recessiva neste período.
O brasileiro, sem dúvida, é um povo bravo. E resistente a chuvas, trovoadas e terremotos.