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Tarcísio e os bolsonaristas

O governador de São Paulo deve sua entrada na política a Jair Bolsonaro, de quem foi ministro. Os apoiadores mais fanáticos do ex-presidente, no entanto, estão decepcionados com Tarcísio de Freitas. A razão? Ele não vem sendo bolsonarista o suficiente e tem tentado desvincular sua imagem à do ex-mandatário.

Embora seja novato na cena política, Tarcísio passou muito tempo no governo federal como técnico (iniciando-se na vida pública, diga-se, durante o governo Dilma Rousseff). Depois, fez parte da administração Michel Temer e acabou no ministério de Bolsonaro. Portanto, pode-se dizer que ele faz leituras políticas corretas e tem grande dose de pragmatismo.

Logo que ocupou o Palácio dos Bandeirantes, o governador tratou de estabelecer uma ponte entre sua administração e Luiz Inácio Lula da Silva. É difícil fazer isso e, ao mesmo tempo, manter uma dose elevada de bolsonarismo no dia a dia. Mesmo assim, ele tomou decisões para agradar o ex-presidente, como nomear o ex-ministro Paulo Guedes para presidir o Conselho Econômico do governo estadual.

Como pragmático, Tarcísio sabe que precisa dar um ar de neutralidade à administração paulista – e vem sendo aconselhado a agir desta forma por Gilberto Kassab, presidente do PSD e um de seus gurus políticos.

Ex-integrantes do governo passado, como Ciro Nogueira, enxergam no governador paulista um candidato natural ao Planalto caso Bolsonaro não possa concorrer. Tarcísio, no entanto, resiste à ideia. Ele prefere tentar a reeleição por São Paulo e considerar a eleição presidencial apenas em 2030. O governador ainda é jovem: ele fará 48 anos em 2023 e pode esperar para disputar uma eleição acirradíssima.

Se esse pleito fosse hoje, no entanto, ele teria de suar a camisa para obter de volta os votos do bolsonarismo raiz. Os bolsonaristas parecem ter características semelhantes às dos seguidores de um culto: exigem de seus pares uma espécie de certificado ISSO 9002 de lealdade ao ex-presidente. Não admitem eventuais concessões nem aproximações com o centro ou com a esquerda, mesmo que em nome da necessidade imposta pelo mandato, como é o caso de Tarcísio.

O estrategista americano Steve Schmidt, que já foi independente e republicano antes de se juntar ao partido Democrata, disse: “Minha fidelidade é ao meu país, não a um partido político; o país vem primeiro”. No caso de Tarcísio, ele está seguindo a mesma cartilha de Schmidt. Ele pode ser criticado por isso?

O noviciado político do governador, no entanto, é responsável por duas escorregadelas na semana passada. Uma delas foi uma declaração infeliz sobre os autistas, devidamente reparada após críticas vindas de todos os espectros da sociedade. Outra foi o veto à distribuição de absorventes a mulheres e adolescentes carentes, uma lei aprovada pela Assembleia Legislativa. Sua justificativa foi a de que esses custos não estavam previstos no orçamento e que as políticas públicas existentes já seriam suficientes para resolver esse tipo de necessidade. Mesmo que o governador esteja certo (algo amplamente contestado pelos especialistas em carências sociais), o custo político deste veto pode ser considerável junto às comunidades mais pobres.

Tarcísio ainda tem tempo para aprender mais sobre os caminhos tortuosos da política. Na montagem do secretariado, por exemplo, teve de deixar apoiadores de primeira hora para trás para colocar no primeiro escalão nomes vindos das alianças políticas. Esse foi seu batismo de fogo. Mas deixar os extremistas de direita ao relento deve gerar reações nas redes sociais que podem incomodar muito.

O governador paulista conseguirá resistir à pressão? É bem possível que sim. Tarcísio, um ex-capitão de exército (como Bolsonaro), sabe que disciplina e resiliência são atributos imprescindíveis para se vencer uma batalha.

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