Por Marta Nogueira
RIO DE JANEIRO (Reuters) – A escolha pela União de um almirante para presidir o Conselho de Administração da Petrobras será algo bom, uma vez que pode garantir trânsito no governo que tem militares em posições-chave e assegurar a defesa dos interesses da estatal, afirmou à Reuters um dos integrantes do colegiado que representa acionistas minoritários.
A União, controladora da companhia, indicou nesta semana o almirante de esquadra, e até então comandante da Marinha Eduardo Bacellar Leal Ferreira, para presidir o conselho, levantando discussões no mercado sobre as influências que o governo poderá ter nas decisões da gigante petroleira.
Marcelo Mesquita, conselheiro eleito pelos minoritários detentores de ações ordinárias, lembrou que o ministro de Minas e Energia Bento Albuquerque é também um almirante, enquanto o próprio presidente Jair Bolsonaro, um capitão da reserva, cercou-se de assessores e ministros do meio militar.
“Em um ambiente hoje que tem muita influência militar… não acho nenhum absurdo. Se eles tivessem colocado 11 almirantes, eu ia dizer que a Marinha ia mandar aqui. Mas não é o caso, colocaram 1 de 11. Um que vai ser o link da empresa com o ministro, que também é da Marinha, com o presidente (da República) que também é militar”, argumentou.
Três conselheiros com mandatos que venceriam apenas em 2020 renunciaram neste mês e serão substituídos. Um quarto também deverá ser substituído, em meio a uma pressão da nova gestão por mudanças, segundo fontes ouvidas pela Reuters anteriormente.
Mesquita, no entanto, minimizou as movimentações e classificou como “mito” a ideia defendida por alguns de que o governo não deveria interferir na gestão da petroleira estatal.
“Influência do governo sempre vai ter, ele é o dono, todo dono imprime algum tipo de viés”, afirmou. “Achar que muda o governo e achar que a empresa não tem nada ver com o governo… Isso é um mito.”
Ele frisou, no entanto, que o importante é garantir que as novas pessoas no conselho sejam “boas, ilibadas, idôneas”, além de comprometidas com o sucesso da empresa, o que ele acredita que irá acontecer.
“Dada a influência que eles (governo) poderiam ter, só terem trocado 4 de 11 mostra um certo respeito em relação ao que está indo bem, de que vamos manter uma certa continuidade do que vinha acontecendo e que estava na direção certa.”
O estatuto social da Petrobras determina desde abril do ano passado que o conselho deve ser composto por 11 pessoas, com no mínimo 40 por cento de membros independentes, percentual que será mantido mesmo após as mudanças, destacou Mesquita.
“O que é importante para uma empresa é a variedade de experiências no conselho para ajudar a empresa em diversas áreas”, destacou ele.
Mesquita também disse avaliar que as trocas não têm acontecido de maneira brusca, mas com discussão entre as partes e dentro de um contexto. “Não tem nada de supetão, de intervenção, nada disso.”
A independência da Petrobras para tomar decisões em prol de sua saúde financeira é um tema sempre em discussão, uma vez que a estatal atua em mercados muitas vezes vistos como estratégicos pelo governo, até por sua importância para os índices de inflação, mas ao mesmo tempo possui ações negociadas em bolsa.
Em governos passados, a petroleira amargou prejuízos bilionários ao oferecer aos brasileiros combustíveis a preços abaixo do mercado internacional. Também sofreu os impactos da operação Lava Jato, que revelou esquemas bilionários de corrupção envolvendo contratos da petroleira.
Essa herança levou o ex-CEO Pedro Parente a defender total independência da empresa em relação ao governo ao assumir o cargo em 2016, indicado pelo então presidente Temer.
Parente, que entrou com a missão de recuperar a credibilidade da petroleira, também não promoveu mudanças no colegiado no início de sua gestão, mas para Mesquita há diferenças em relação àquela época, até mesmo em termos do perfil dos executivos.
O presidente Bolsonaro indicou o economista Roberto Castello Branco, um ex-diretor da Vale e ex-conselheiro da própria Petrobras, para presidir a companhia em sua gestão.
“O Parente, quando entrou, era um cara forte de um governo fraco… É uma questão de estilo também. As pessoas têm estilos diferentes”, avaliou Mesquita.
CESSÃO ONEROSA
Um dos temas cruciais para a Petrobras neste ano, que deverá passar pelo Conselho de Administração, será a renegociação com a União de um multibilionário contrato para a exploração de regiões do pré-sal assinado em 2010, a chamada cessão onerosa– mudanças nos termos do acordo já eram previstas após a declaração de comercialidade das áreas, que já ocorreu.
No início do mês, a Petrobras disse que um dos cenários em análise no Tribunal de Contas da União (TCU) para a revisão levaria ao pagamento pela União à estatal de 14 bilhões de dólares. Na véspera, o Ministério da Economia havia negado em nota à imprensa que esse seria o valor a ser pago, após uma reportagem do Valor Econômico citar o número.
Questionado sobre o assunto, Mesquita disse que um eventual movimento como esse por parte do governo poderia enfrentar resistência de conselheiros ou acionistas.
“O tempo dirá se o governo vai querer mexer nos 14 bilhões de dólares ou não. E se for mexer, vai ter que lidar com os minoritários na Petrobras e até com o conselho, que pode não querer aprovar o valor e aí é uma confusão… Então é uma questão negocial que vai ser racional”, disse.
(Por Marta Nogueira)