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Os aplicativos de entrega fornecem renda para os mais jovens – e são execrados pelos “humanistas”

Por Douglas Sandri e Ricardo Birmann

Há uma verdadeira inflação de artigos e reportagens na internet sobre o número crescente de jovens ciclistas que trabalham como entregadores de aplicativos como Rappi, iFood e UberEats. 

A intenção é sempre a mesma: ilustrar uma suposta “precarização do emprego”.

Em uma rápida “googlada”, você encontra as seguintes chamadas:

O percurso desumano da comida até sua casa

Apps são os maiores empregadores, mas precarização dá o tom nos trabalhos

O rápido e inseguro caminho dos ‘precários digitais’ contra o desemprego

Dormir na rua, pedalar 30 km e trabalhar 12 horas por dia: a rotina dos entregadores de aplicativos (esse é o titulo mais apelativo de todos, pois dá a entender que os empregados são mendigos e sem-teto)

Sociologia e trabalho a partir dos entregadores ciclistas

Entregadores de aplicativos: sem patrão e sem direitos

Euforia com aplicativos de serviços dá lugar à frustração de trabalhadores

Entregadores pedalam 10h por dia por “salário” de R$ 1,5 mil

Desemprego provoca ‘boom’ de entregadores por apps na Capital

‘Bikeboys’ rodam 12 horas por dia e 7 dias por semana para ganhar R$ 936

Serviços de entrega e uberização do trabalho: boicote é a solução?

O lado sombrio do trabalho para aplicativos – e como é pior para mulheres

Alguns desses textos (e charges) chegam ao ridículo de comparar a ocupação à escravidão, o que denota, na melhor das hipóteses, absoluta falta de compreensão do conceito de escravidão.

Por tudo isso, são importantes alguns contrapontos.

Aplicativos são consequência – e salvação 

O desemprego entre jovens brasileiros atinge 25,7% (entre 18 e 24 anos). Apenas na capital paulista, há cerca de 30 mil entregadores de aplicativos trabalhando com bicicletas, 75% dos quais entre 18 e 27 anos de idade.

Logo, o drama dos jovens não é o “trabalho precário” ou a “escravidão moderna” ocasionada pela economia do século XXI, mas sim o desemprego. E o desemprego é um fenômeno econômico, que deve ser entendido — e abordado — como tal. 

E, nesse sentido, se o objetivo é proteger e amparar os jovens brasileiros, e contribuir para que saiam do ócio improdutivo e resistam às tentações do crime, é crucial, acima de tudo, enaltecer e parabenizar as empresas que têm sido capazes de gerar emprego e renda para essas pessoas — mesmo porque, fornecer empregos que pagam até R$ 1,5 mil por mês (não obstante o rigor físico do trabalho) está longe de ser algo condenável.

Outro aspecto que vem sendo criticado (de forma tão ampla quanto superficial) é a “informalidade” do emprego — como se trabalhar na economia chamada “informal” fosse um demérito ao trabalhador. Mas a pergunta que não é feita é: por que esse mesmo trabalhador não consegue uma vaga no mercado “formal”?

Parte da resposta está associada ao alto custo da formalidade laboral no Brasil. Os encargos sociais e trabalhistas são as principais barreiras. Por exemplo, se você contratar um trabalhador por R$ 1.500 (valor que, como visto, alguns entregadores de aplicativo recebem por mês), e não pagar nada de vale-transporte, vale-refeição, plano de saúde, e outros benefícios, você gastará ao todo praticamente R$ 2.300 por mês (INSS, FGTS, provisão do 13º, férias etc.) — ou seja, seu gasto será mais de 50% maior que o salário. 

(Em algumas ocasiões, um empregado pode custar muito mais do que o dobro do salário. O corriqueiro é que ele custe, no mínimo, o dobro do salário.)

A reforma trabalhista de 2017 trouxe algumas mudanças, mas ainda temos uma das legislações trabalhistas e sindicais mais engessadas e ultrapassadas do mundo. Estamos condenando jovens ao desemprego pelas regras complexas da CLT e o alto custo da contratação para o empregador.

O governo até tenta endereçar este problema com o Programa Verde Amarelo. Por meio de medida provisória, o Ministério da Economia concedeu redução de obrigações e impostos (de 30 a 34%) para empresas que contratarem, até 2022, jovens entre 18 e 29 anos em início de carreira. Estima-se que esse tipo de contratação pode chegar a 270 mil

O problema é que isto significa uma perda de arrecadação estimada de R$10 bilhões em cinco anos, que precisa ser compensada. Uma das propostas foi taxar o seguro-desemprego (sendo que essa taxação contaria como contribuição para o tempo de aposentadoria pelo INSS). Mas tal proposta já foi rechaçada.

Isso mostra que o problema existe e não é de fácil solução. Mas é urgente desmontar este aparato pesado criado em cima da formalização do trabalho de maneira mais ampla e permanente. Para que mudanças mais duradouras sejam possíveis é crucial proceder a uma diminuição do tamanho do estado por meio do ajuste na despesa.

A qualidade da mão-de-obra

Mas tudo piora.

Dados do Ministério da Educação demonstram que 7 de cada 10 alunos do ensino médio têm nível insuficiente em português e matemática

Ou seja, estão chegando ao mercado de trabalho milhões de jovens com sérias dificuldades de interpretar e escrever textos, bem como de fazer uma simples regra de três. 

E aí tem-se uma combinação explosiva: jovens chegam mal preparados ao mercado de trabalho (ou seja, com baixa produtividade), e ainda têm de superar o obstáculo criado pelas regras engessadas e burocráticas para que possam ofertar sua mão-de-obra. Quem irá contratar legalmente — isto é, a um alto custo — jovens inexperientes e com baixa produtividade? 

Isso é teoria econômica básica. Só é possível pagar altos salários a quem produz muito com pouco, isto é, quem gera muita receita (e lucros) para seu empregador. Se um jovem sem instrução e sem habilidades possui uma produtividade capaz de gerar apenas R$ 1.500 por mês a um eventual empregador, não tem como esse empregador lhe contratar formalmente a um custo total de R$ 2.300.

Nada é mais responsável pela “degradação do mercado de trabalho” do que um ordenamento jurídico que condiciona o status de “formal” ao cumprimento de regras onerosas tanto ao trabalhador quanto ao empregador. 

Outros obstáculos

Os encargos sociais e trabalhistas são apenas uma parte dos obstáculos. Vale mencionar o outro lado do pesadelo empreendedorial, que são os outros impostos que incidem sobre as empresas e que afetam sobremaneira sua capacidade de investir, de contratar e de aumentar salários. No Brasil, a alíquota máxima do IRPJ é de 15%, mas há uma sobretaxa de 10% sobre o lucro que ultrapassa determinado valor. Adicionalmente, há também a CSLL (Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido), cuja alíquota pode chegar a 32%, o PIS, cuja alíquota chega a 1,65% e a COFINS, cuja alíquota chega a 7,6%. PIS e COFINS incidem sobre a receita bruta. 

Há também o ICMS, que varia de estado para estado, mas cuja média nacional beira os 20%, e o ISS municipal. Quem vai encarar?

Quando você considera o paternalismo, a ausência de liberdade nas relações trabalhistas, a carga tributária elevadíssima (não nos esqueçamos também que o entregador ciclista paga cerca de 70% em impostos para comprar sua bicicleta), o ambiente hostil a investimentos, e a ausência de um ambiente que incentive o empreendedorismo, você entende que não há mistério nenhum no fato de a produtividade brasileira estar estagnada

Para concluir

Por tudo isso, sim, as empresas de aplicativo são uma grande benesse para a economia. 

Mas eis o mais importante: se há algo que milhares de garotos que pedalam fazendo entregas podem ilustrar é o espírito honesto, trabalhador e empreendedor do brasileiro que “não descansa”.

Será que nossos jovens estão despreparados para o mercado formal? Ou será que é o mercado formal é que está despreparado para os nossos jovens?

Nenhum país progride sem respeito ao trabalho. Tampouco progride condenando quem gera oportunidades e quem se propõe a encarar as adversidades e virar o jogo a seu favor, aprendendo pela experiência valores que a educação de fato não lhe deu.

Os jovens agradecem.


https://www.mises.org.br/article/3211/os-aplicativos-de-entrega-fornecem-renda-para-os-mais-jovens–e-sao-execrados-pelos-humanistas

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