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Vamos discutir o que é “bolsonarismo raiz”

O governador eleito de São Paulo, Tarcísio de Freitas, trouxe à baila uma discussão interessante. Em entrevista à CNN, ele disse: “Eu nunca fui bolsonarista raiz. Comungo das ideias econômicas, principalmente desse governo Bolsonaro. A valorização da livre iniciativa, os estímulos ao empreendedorismo, a busca do capital privado, a visão liberal. Sou cristão, contra aborto, contra liberação de drogas, mas não vou entrar em guerra cultural”.

Na prática, Tarcísio quer dizer que é possível ser conservador sem ser extremista.

Existem, hoje, três tipos de conservador no Brasil. O primeiro é, como disse o governador eleito, o ‘bolsonarista raiz”. Radical e inconformado, esse eleitor está em frente aos quarteis, clamando por um golpe militar, ou em casa, apoiando os manifestantes. São indivíduos que acreditam em uma guerra santa na política e argumentam em favor de sua causa com uma dose altíssima de agressividade.  Esse grupo também tem algo em comum: proliferam fake news com uma desfaçatez enorme e acreditam piamente em teorias da conspiração que tenham a ver com suas crenças.

O segundo grupo é um grupo antipetista que via em Jair Bolsonaro a única forma de brecar a ascensão de Luiz Inácio Lula da Silva. São conservadores, sim. Mas, antes de mais nada, pragmáticos. Viraram a página em 30 de outubro e estão tocando a sua vida, sem deixar de fazer suas críticas quando leem as notícias sobre o governo de transição.

Por fim, há o conservador antibolsonarista. São pessoas que seguem a agenda conservadora, mas não suportam a figura de Bolsonaro, com seu estilo belicoso, discurso politicamente incorreto e vocação para tripudiar em cima dos adversários.

O que une esses três grupos?

Um conjunto de valores típico da direta: a defesa do capitalismo e de uma agenda tradicionalista de costumes. Mas há diferenças significativas entre esses agrupamentos eleitorais, que devem se acentuar a partir de 2023.

O bolsonarismo raiz continuará a existir. A questão é: será a vitrine da direita como um todo? Ou vai representar somente a extrema-direita? Na Europa, esse tipo de pensamento extremista engloba questões que não são muito populares no Brasil, como a xenofobia, o antissemitismo e o nacionalismo. Aqui no Brasil, porém, os seguidores dessa cartilha fazem um cruzamento entre religião e militarismo – como se os militares representassem, sempre, a melhor solução para qualquer problema brasileiro (os 21 anos que passamos sob tutela dos generais, no entanto, mostraram que isso não é verdade).

Além disso, o bolsonarista raiz é assombrado constantemente pelo fantasma do comunismo. Para eles, estamos sempre às vésperas de nos tornarmos uma nova Cuba ou nova Venezuela. Só que não há massa eleitoral suficiente para que os comunistas tomem o poder por aqui. Lembremos dos quatorze anos em que o PT mandava em Brasília. Tivemos corrupção, inchaço na máquina estatal, desprezo ao tripé econômico (na gestão Dilma Rousseff) – mas não houve uma só estatização ou aceno à implantação de um, como dizia Leonel Brizola, socialismo moreno.  

Tarcísio de Freitas, ao dizer que não era “raiz”, manifestou a verdade (mesmo assim, irritou os seguidores mais fiéis do presidente Bolsonaro). Afinal, ele surgiu na vida pública durante o mandato de Dilma, como diretor do DNIT, e se projetou durante o governo de Michel Temer. Pragmático, não questiona o resultado das urnas e afirma que manterá um canal de diálogo com o presidente eleito. Mas, ao mesmo tempo, toma cuidados para que não o julguem como um traidor. Afinal, mantém uma linha direta com Bolsonaro, insistindo com o presidente para que ele “saia do casulo” e lidere “uma oposição responsável” ao PT.

Durante todo o tempo em que Jair Bolsonaro foi presidente, ele se dirigiu somente ao seu eleitorado raiz. Na oposição, ele adotará um estilo mais moderado, com discurso mais amplo e abrangente?

Evidentemente, essa é uma pergunta absolutamente retórica.

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