Escritor de sucesso, filho de família pobre e formado na prestigiada Yale, ele se coloca como representante dos americanos (brancos) abandonados pelos governos
Senador pelo estado de Ohio, J.D. Vance (39) foi confirmado como vice na chapa de Donald Trump (78), na tarde desta segunda-feira (15), durante a convenção republicana, em Milwaukee, Wisconsin, que sacramentou o ex-presidente como candidato à Casa Branca. A confirmação do homem forte que domina o Partido Republicano e a escolha de seu vice é uma combinação que busca o público atraído pelo Maga, acrônimo do lema Make America Great Again (Torne a América Grande Novamente), criado na campanha presidencial de Ronald Reagan (1911-2004) e absorvido por Donald Trump.
Vance superou os proponentes Doug Burgum, governador da Dakota do Norte, e Marco Rubio, senador pela Flórida. Ambos foram avisados mais cedo que não seriam escolhidos. Vance se apresenta como uma versão jovem e sob medida, dentro do possível, de Trump. Ele vem de Ohio, estado onde os republicanos reforçam presença, enquanto Dakota do Norte e Flórida são redutos consolidados. O candidato possui uma biografia de superação, valores conservadores aos olhos do eleitorado branco e cristão e sucessos estudantil e profissional que o tornaram a encarnação do bom americano vindo do Cinturão da Ferrugem (Rust Belt), formado por estados que entraram em declínio junto com a indústria pesada dos Estados Unidos. Neste aspecto, suas credenciais são melhores que as de Trump, cuja família começou a fazer dinheiro e ter sucesso ainda com seu avô.
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Filho de uma família de classe operária, foi fuzileiro no Iraque após o ensino médio, conseguiu cursar direto em Yale e escreveu um best seller que virou longa do Netflix, Hillbilly Elegy (Era uma vez um sonho, com Amy Adams e Glenn Close), que romantiza a vida de sua família pobre, interiorana e assolada pelo desemprego, alcoolismo e falta de estudos. A trama corre quando ele começava a subir na vida pelos próprios esforços, superando as piadas sobre sua origem matuta enquanto fazia os contatos que o levariam ao mercado financeiro.
Conservador populista, Vance marca posição sem ser necessariamente agressivo. É contra o aborto, mas concorda com exceções em casos de estupro e incesto; se diz opositor da Lei do Respeito ao Casamento, de 2022, que reconhece casamentos civis entre pessoas do mesmo sexo, mas evita polemizar. Tanto que declarou: “Casamento é entre um homem e uma mulher, mas não acho que a questão do casamento gay esteja viva agora. Não sou um desses caras que está tentando tirar as famílias das pessoas e separá-las”.
Em termos econômicos, Vance apoia reformas protecionistas para repatriar empresas que migraram dos EUA, defende maiores restrições à China e se posta contra as big techs, propondo até “dividir” o Google e o Meta para reduzir suas influências políticas e controles sobre dados pessoais. Considerando a realidade de seu eleitorado, dá para entender.
Quando o tema é aquecimento global e extremos climáticos, é um reducionista com os olhos voltados ao tanque de seu carro: “Se você acha que as mudanças climáticas causadas pelo homem são um problema catastrófico, a solução para isso é produzirmos mais de nossa própria energia, incluindo combustíveis fósseis, aqui nos Estados Unidos”.
Vance já criticou a postura belicosa de Trump contra os imigrantes, mas defendeu a construção do muro na fronteira com o México – obra que nunca saiu. A distância entre ambos foi reduzida depois que endossou o republicano como “um dos poucos líderes políticos na América que reconhece a frustração que existe em grandes partes de Ohio, Pensilvânia, leste do Kentucky”, citando as áreas onde há grandes populações pobres e brancas.
Na política internacional, repete Trump: a Otan deve focar no Leste Asiático, a Ucrânia precisa ceder territórios à Rússia e Israel continuará a ganhar armas para enfrentar o Hamas.
Contra Biden, ele não pega leve. Após os tiros contra Trump, no sábado (13), Vance afirmou que a culpa do atentado veio das críticas da campanha democrata (abaixo). Em troca, o atual presidente mandou hoje: “Aqui está a questão sobre J.D. Vance. Ele fala muito sobre os trabalhadores. Mas agora, ele e Trump querem aumentar os impostos das famílias de classe média enquanto promovem mais cortes de impostos dos ricos”. A briga entre eles não é nova. Em 2022, o jornal New York Times afirmou que Vance deu uma declaração “flagrantemente falsa” ao alegar que a política de imigração de Biden inundava Ohio com drogas ilegais.
O teste virá com a exposição fora de seu reduto e na hora que for comparado de fato com a atual vice, Kamala Harris, uma não-branca filha de imigrantes e ex-procuradora de justiça da Califórnia que ganhou fama de linha-dura.