Por Eduardo Simões
SÃO PAULO (Reuters) – A crise provocada pela paralisação dos caminhoneiros, que chegou ao oitavo dia nesta segunda-feira, expôs a fragilidade e a desarticulação do governo do presidente Michel Temer e complicou ainda mais a já difícil situação de uma eventual candidatura governista na eleição presidencial de outubro, respingando também nas chamadas candidaturas de centro.
A resposta do governo à paralisação da categoria, que provocou desabastecimento em todo o país, foi alvo de críticas em reservado até mesmo de parlamentares de partidos que já foram da base aliada de Temer e gerou o que analistas ouvidos pela Reuters chamaram de tentativas de capitalizar eleitoralmente com o episódio.
“Um processo que expôs a desarticulação da base governista em continuidade ao fenômeno que a gente já observava, um governo com baixo poder de agenda e refém de temas negativos”, disse à Reuters o analista político da Tendências Consultoria Rafael Cortez.
Para o cientista político Carlos Melo, do Insper, a resposta do governo à crise “foi um desastre”, pois o Palácio do Planalto fracassou ao não se antecipar aos problemas e, quando a crise estourou, ter entrado em pânico.
“Ele não protegeu o acionista da Petrobras, ele não protegeu o cidadão comum, ele não protegeu o caminhoneiro também, que continua insatisfeito”, disse Melo, que vê no atual episódio um precedente preocupante.
“O governo se mostrou fraco e ruim de negociação e eu acho que ele abriu um flanco muito perigoso para todas as outras corporações. Não à toa os petroleiros estão falando em greve e você pode esperar outras corporações também falando em greve.”
O desempenho do governo também foi alvo de críticas duras de parlamentares que já foram alinhados ao Palácio do Planalto na gestão Temer.
Para o líder de um partido da base, que falou na condição de anonimato, trata-se de um “desgoverno”.
“O governo já estava assim (fraco). Nessa questão, entregou tudo sem garantia de que os caras vão responder”, disse esse líder. “O Congresso vai ter que fazer o que já vem fazendo, vamos tocar nossa vida, cuidar das pautas que temos. Não há necessidade de negociação com esse governo.”
Um outro líder parlamentar adotou posição similar e fez ainda avaliação de que a fragilidade do Planalto permitiu que grupos tirassem vantagem dessa vulnerabilidade.
Apesar de parlamentares criticarem a postura de Temer –que no auge da greve em evento com entrega de veículos para o Conselho Tutelar no Rio chegou a dizer que aquilo era a coisa mais importante que faria no dia–, analistas também viram falhas no papel desempenhado pelo Legislativo neste processo.
O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), patrocinou, contra a vontade do Planalto, a inclusão no texto da reoneração da folha de pagamento da isenção do PIS/Cofins para o diesel, cometendo um erro de cálculo no impacto que a medida teria nas contas públicas.
Já o presidente do Senado, na quinta-feira, conforme os episódios de desabastecimento se acumulavam, deixou Brasília em direção a seu Estado natal, o Ceará. No entanto, diante da exposição sofrida pela ausência, acabou retornando à capital.
Melo, do Insper, classificou como “um horror” a atitude de Eunício, enquanto Cortez, da Tendências, avaliou que a atitude de Maia pode ter sido motivada por “um certo oportunismo de tentar transformar essa crise em algum ganho eleitoral”. Maia é pré-candidato à Presidência pelo DEM.
IMPROBALIDADE GOVERNISTA
O cenário de fragilidade do governo, que agrava a impopularidade de Temer e de sua administração –batuques de panelas puderam ser ouvidas durante o pronunciamento do presidente no domingo– tem ainda o efeito de tornar ainda mais improvável a empreitada de uma candidatura governista ao Planalto, atualmente encampada pelo ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles (MDB).
“A greve dos caminhoneiros derrubou o único pilar que o governo tinha para defender um projeto eleitoral em 2018, que seria a reconstrução da política econômica… Dificilmente essa ideia de continuidade vai prevalecer no comportamento eleitoral, o que significa que o eleitor vai olhar para alguém distante do governo”, disse Cortez.
“Me parece que tal cenário sinaliza a improbabilidade de um projeto presidencial do MDB e, mais do que isso, há o risco de ‘sarneyzação’ crescente do processo de 2018, quando candidatos e nomes ligados ao status quo tiveram muita dificuldade em convencer o eleitorado”, acrescentou, referindo-se à sucessão de José Sarney em 1989.
Nesse cenário, candidatos não identificados com o governo podem se beneficiar. Incluem-se neste grupo o pré-candidato do PSL, Jair Bolsonaro, e nomes mais à esquerda, como Ciro Gomes (PDT).
“Esse clima, essa radicalização, não chama por moderação. Ela atende aos extremos… Isso joga água no moinho do Bolsonaro. Agora, também a esquerda, por conta da radicalização, do mau momento, também é favorecida”, disse Melo.
“Eu sei é que o centro moderado e sobretudo o centro identificado com o governo é o que mais perde. O desastre foi no centro.”
(Reportagem adicional de Lisandra Paraguassu, em Brasília)